“NÃO GRITES… vais assustar o resto do Bloco de Partos!”

Logo a seguir ao cheirinho de recém-nascido, das coisas que mais gosto num Bloco de Partos é o som dos puxos.

Cada mulher tem a sua maneira de parir… Há quem o faça em silêncio. Há quem suspire. Há quem grite. Há quem ria.

Começo logo a sentir borboletas na barriga por se aproximar o momento mais mágico que acontece naquele lugar.

Mas… ao olhar em redor, o que vejo geralmente são esgares de desaprovação e incómodo pelos sons do parto. Lembro-me logo dos momentos em que, quando ainda tinha dentes de leite, tentavam ensinar-me os Mandamentos para ser uma Menina Bonita. “As Meninas Bonitas não falam alto”. Não?! Porque não?!

O grito no parto não é necessariamente um grito de sofrimento. Muitas vezes é uma exteriorização de energia corporal, uma forma de aliviar a tensão do momento e ganhar forças. É um som que vem cá de dentro e é incontrolável.

Parir é mais fácil se esquecermos os moralismos e tabus. É um momento de introspeção e de encontro consigo mesmo. Será preferível “desligarmos” o neocórtex e guiarmo-nos pelo cérebro primitivo. Sim, parir é algo animal, mamífero, belo.

Como podemos criticar o comportamento de alguém que gerou dentro de si uma vida e está com toda a sua força a espremer das suas entranhas um ser? Não é este o milagre da vida?

Fazer barulho é natural durante o trabalho de parto. Curiosamente, ao relaxar os maxilares conseguimos relaxar também os músculos da pélvis, o que facilita todo o processo. E uma maneira de relaxar os músculos do maxilar é precisamente abrir a boca e vocalizar sons graves. Forçar o silêncio é cerrar a boca, contrair os músculos do maxilar e consequentemente contrair o períneo, dificultando a descida do bebé.

“Não grites… vais assustar o resto do Bloco de Partos!” Assustar? Deviam era sentir-se inspirados!

Proibir o grito é censurar a mulher e fazê-la sentir inapropriada. É tirá-la do seu mundo interior e provocar-lhe stress, prejudicando o desenrolar do trabalho de parto com o aumento dos níveis de adrenalina.

Por isso, quando me perguntam “Gritei muito? Portei-me mal?”, apetece-me abraçar aquela Mulher e dizer “Porta-se mal quem te tenta calar! No parto ou fora dele.”. Mas apenas a asseguro “Foste uma heroína, uma lutadora… e as lutas geralmente não são silenciosas. Fizeste tudo bem!”.

Como Ina May Gaskin diz: “Se uma mulher não parecer uma deusa durante o parto, então alguém não a está a tratar corretamente”. E sim, nem todas as deusas são silenciosas.

Por isso, grita, vocaliza, sussurra, ri, geme… O parto é teu.

~ Mariana Torres, médica interna de ginecologia e obstetrícia, sócia da APDMGP

11 comentários em ““NÃO GRITES… vais assustar o resto do Bloco de Partos!”

  1. Tão bonito.
    Eu gritei. Muito muito muito.
    Houve ali um momento em que uma enfermeira, a mesma que saltou para a maca e me fez a dolorosa manobra de Kristeller – nome que eu viria a conhecer apenas após o parto, ao pesquisar sobre o assunto – me disse, me mandou: “Não grites”. No segundo seguinte, acrescentou: “Grita o que quiseres”.
    Um parto é mesmo algo muito mágico e especial. Único. Tenho muita vontade de passar pelo próximo 🙂

  2. A minha experiência foi horrível. Gozaram comigo por não ter participado nas aulas de preparação para o parto. Não ajudaram nada. Taparam me a boca quando gritei um bocadinho mais alto e disseram: ‘ Nem se atreva a gritar, tenho senhoras nos quartos ao lado… Não me faça isso!’. Estava com muita febre e cheia de dores nos rins por ter estado quase 12 horas deitada. Entrei ás 14:00 e a minha filha nasceu no dia a seguir ás 7:52.
    A experiência de ter um filho para mim não foi especial. a Gravidez em si, um fenómeno espectacular e o encontro com o bebé, o melhor que há! Cesariana só quando viram que a bebé já estava a sufocar por já ter saído todo o líquido existente…
    Amo a minha filha mais do que qualquer coisa no Mundo.

  3. MEDO muito MEDO!!! Vivam os anestesistas e as epidurais e os partos sem gritos e a sorrir😂😂😂😂😂

  4. Os meus berros ouviram-se em todo o piso do hospital e eu rio-me sempre sempre disso! O parto não deve ser um acto social mas um momento pessoal.

    1. Lembro-me de ter gritado e um enfermeiro foi mt desagradavel.naquele momento senti.me mal como se tivesse feito algo de muito errado. Tenho pena d ter estas memorias do meu parto. Ao ler este texto penso como adoraria naquele dia ter estado roadeada de profissionais assim.

  5. Criam poema a volta do parto, mas é sim muito doloroso e difícil. Enganem-se as mães de primeira viagem que lêem certas descrições e se tentam convencer que vão viver o poema do nascimento. É um momento especial, é! É um momento único? É! Mas dói e dói muito!!! Viva a epidural!! No entanto, liberdade para a vontade de cada uma claro.

    1. Não se enganam nem um pouco. Se a mulher se preparar física é psicologicamente o parto não dói assim tanto. O meu foi fantástico, super rápido, sem epidural, só eu e a minha filha no nosso ballet e vocalizações de mantras. Garanto que é possível, só precisamos nos fazer acompanhar das pessoas certas. 😉

  6. Eu não quis saber dos comentários tristes, fiz o que me a natureza me pediu, gritei, tremi e fiz força. Tive comentários ” Não grites.”; “Tás a tremer porquê?”; ” Não faças força poque te vais rebentar toda.”; “Pensa quando o estavas a fazer…”, etc… Eu acho que muitas que ali estavam deveriam também ir a aulas de como ajudar no parto. Correu tudo bem…o médico disse “ainda bem que a mãe foi irreverente, assim foi muito mais rápido”. Só me limitei a seguir a natureza e o meu instinto. As pessoas que não gostam do seu trabalho deveriam dar lugar a outras.

  7. Junho 2022 Bragança Não grite, a força assim fica na garganta…episiotomia, ventosa e manobra em cima do ventre…ainda assim esperava pior…é triste…

  8. Realmente O momento do parto deveria ser tratado como algo pessoal e não social por que num momento de dor que só quem sabe é quem está sentindo não tem como pensar em ser social e sim querer que aquele momento acabe logo e dê tudo certo
    é crucial a importância de profissionais humanos capazes de se sensibilizar com a dor do outro e não julgar a forma de externar esse momento tão doloroso.

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